quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Transicionei quando subi e desci a Fonte Grande. Transmutei de flor para terra quando mergulhei nas luas e aceitei: hoje sou benzendeira porque virei travesti e antes fui sodomita porque sabia prevê o futuro.Virei travesti quando acessei minha ancestralidade sodomita, e dobrei o Tempo colonial que nunca me fez sua. A espiritualidade travesti não existe, porque esse não é nosso nome. Travesti não se traduz e travesti já é uma tradução. Travestilidade e espiritualidade são traduções coloniais de nossas transmutações. Ou com nosso alfabeto conseguimos construir linguagens de fuga? 

Sou macumbeira porque sou negra. E perambulo na luz negra, porque sou travesti. 

Escrevo em português para dizer que macumba ta no meu sangue, e se no meu sangue há mar é porque sou rio que afunda e chorou de alegria quando eu morri. Para a alquimia, transmutação é a conversão de um elemento químico em outro. Somos alquimistas porque de corpo-flor transicionamos para ametista, e na tradução colonial viramos apenas travestis. 

A macumbaria é uma encruzilhada feita com Química, Física, Biologia, Medicina, Semiótica, Arte, , Astrologia, Filosofia, Metalurgia, Geologia e Matemática. E a minha transmutação foi quando derreti no encontro de fogos, e nesse fogaréu beijei minha pomba gira e a disse: muitas gracias, lembrei que também sou éter, virei trava. 

Porque foi incorporando que vivi o Tempo espiralado, e deixei minha matéria ser dilacerada pela rapidez de Gêmeos e ventania e Oya. Eu morri mas ainda não fiz o que devo fazer. Porque eu mergulhei bem fundo e gozei tendo medo. Eu não aguento mais essa década. Em minha garganta tem um choro preso num corpo que não é mais meu. Essa  noite vou girar até morrer. Morrerei lembrando de tudo, e voltarei para buscar os estantes que não vivi por ter medo de amar. Te amo meu preto, 

eu estou transmutando. porque entrei na macumba e transmutei antes de transicionar. ou enquanto transicionava.  porque esse Mundo me disse que eu estava transicionado antes de eu ter coragem de assumir que sim estava indo a um outro outro lugar. mas quando a tive - a coragem - eu abandonei o lugar da transsexualidade que nunca me permitiram ficar e reencontrei meu corpo fora da cognição cisgênera que não alcança a frequência que a transmutação travesti produz. é um som distante. mas que irrita porque se faz perto, e essa distancia pequena é necessária para a existência da cisgeneridade.

tenho tido uma vontade enorme de ter peitos. peitos tem sido a transmutação. sonho com peitos grandes e pequenos mas não sei dimensiona-los de fato. lembro que preciso experimentar para consegui entender. então tenho estudado hormônios. hominização. o que é o hormônio em nosso corpo carnal? sei e sinto que o bloqueador enfraquece minha relação com Exú. Pois bloquear a testoterona de meu corpo é diminuir a libido. sim, exu não é só libido, mas pra mim tem sido muito disso.

sinto meu corpo com fome de modificação. então vou pro cabelo. vou pra cabeça. vou pro ori. Modificações carnais. dessa frequencia encarnada.

na fonte grande eu não sabia que era negra. gostava de pau, e não tinha problemas com buceta. não conhecia a disforia nem o racismo. a disforia é racista. o racismo também é uma disforia.
e quando me aproximo de outros mundos me sinto melhor. Mundo vegetal e mineral e animal.
É isso. estou me equilibrando. conectar-me aos mundos animais, vegetais e minerais.